Crônicas Esvaecidas #02

Coluna: Crônicas Esvaecidas - microcontos medievais e míticos

Segundo micro conto chega a vocês para vosso deleite. Como o piloto possuiu um bom feedback através de boas críticas e elogios (ou simplesmente porque querem ver em que essa porra vai dar). Esse traz um enredo mítico. Confira:

Presas na Neve

No inverno, anoitece muito rápido. Antes das cinco da tarde, o crepúsculo começa a instaurar no céu. Já passara algumas horas desde que anoiteceu. A cidadela começava a trancafiar todos os portões. O sino da igreja soou pela última vez do dia, indicava que faltavam duas horas pra meia-noite e que era esse o toque de recolher.

Este inverno estava com muita neve. Mas não nevava agora, no entanto não podia se ver estrelas e a lua no céu. Apenas as luzes da cidadela iluminavam aquela noite.

Dirigir-me para a torre do portão Norte para cumprir o meu turno. Minha mente estava inquieta, desde que eu nascera sabia que quando isso acontecia era que algo trágico aconteceria. Era um dom, ou uma maldição, que os deuses me presentearam. Um estalo no fundo da minha alma me deixou alerto subitamente. Saquei minha espada da bainha, ela era magnífica. Feita de uma liga de prata, podia brilhar a mais fraca das luzes, e a lamina era toda trabalhada com runas célticas entalhadas.

Eu estava certo. Um uivo, que congelaria e espatifaria em milhares de cristais de gelo a alma do mais bárbaro dos guerreiros. Virei-me a tempo de defender com o fio da minha espadada a investida daquela criatura enorme e animalesca. Sua respiração poderia corroer o mais sólido dos aços.

Sabe qual é o maior problema dos licantropos? Não é seu tamanho intimidador, nem suas garras afiadas e duras como diamante, nem suas presas mais pontiagudas que estalactites, nem a áurea de medo que ele impõe, nem sua força descomunal. É o estado de frenesi que ele entra quando assume sua forma de homem-lobo.

Tive sorte de defender o primeiro golpe. Mas a sorte são como os ventos, mudam de direção rapidamente. Não consegui acertar o golpe e levei uma patada forte no meu flanco esquerdo. Graças aos deuses não foi suficiente para ferir minha pele, senão provavelmente seria infectado com essa repugnante maldição. Porém desequilibrei do meu posto na varanda da torre e caí. Só não me encontrei com o chão coberto pela neve pois a alça da bainha da minha espada prendeu a uma saliência do parapeito. Mas isso não é uma preocupação quando se tem uma besta do dobro de altura de um homem comum. Suas garras vieram de encontro ao meu rosto horrorizado. Agi a tempo e consegui ferir seu braço peludo e caí no chão diante de tal feito. O lobisomem pulou do parapeito da torre para cima de mim. Empunhei a espada perpendicularmente ao meu peito, quando o dorso da criatura encontrou o meu, já estava perfurado de ponta a ponta por minha lâmina. O lobisomem morrera. E aquela temível criatura transfigurou-se em um homem de idade avançada que esboçava em seus lábios inertes um tenro sorriso. Um sorriso de agradecimento, por ter-se livrado da maldição. Pois apenas a lâmina de prata pode matar um licantropo.

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